açucar

Por que desejamos tanto consumir tudo o que nos leva à ruína


Você já parou para pensar como ou por que os animais comem justamente os alimentos que lhes fazem bem? Você não precisa ensinar um lobo a gostar de carne, ou uma ovelha a gostar de grama. O paladar, como de resto todas as demais características de um animal, foi selecionado por milhões de anos de modo que animais que naturalmente gostassem mais daqueles alimentos que lhes mantivessem saudáveis teriam mais chances de sobreviver. Por que seria diferente com a espécie humana? Por que desejamos tanto consumir tudo o que nos leva à ruína, como açúcar e guloseimas, derivados de trigo e todo o tipo de alimento processado e industrializado?

John Yudkin (1910-1995) foi um fisiologista e cientista britânico que estudou profundamente a influência dos carboidratos (em especial a sacarose e a frutose) na gênese das doenças humanas. Era um homem muito à frente do seu tempo. Desde 1957 já afirmava que o açúcar era o maior responsável pela aterosclerose, doença coronariana, diabetes e obesidade, contrariando a teoria lipídica da doença cardiovascular, que acabou vencendo a guerra de relações públicas e propaganda, apoiada pela indústria de drogas anti-colesterol. Eu sem livro de 1972 denominado “Pure, white and deadly” (puro, branco e mortal), atualmente indisponível (Atualização: O livro foi reeditado! Pure, White, and Deadly: How Sugar Is Killing Us and What We Can Do to Stop It), mas do qual consegui uma cópia, já constava todo o conceito de síndrome metabólica, que só seria formalmente enunciado e adotado pela comunidade científica em 1988.

Neste livro fascinante (clique aqui para conhececer mais sobre este livro e sobre os efeitos deletérios do açúcar), há um trecho muito elucidativo (página 160), que o Dr. Souto traduziu de forma livre e transcrevo abaixo:

O ser humano tornou-se cada vez mais hábil em separar desejo e necessidade, a tal ponto que a satisfação desenfreada do desejo tornou-se desastrosa para o indivíduo e para a espécie. As pessoas sempre desejaram alimentos doces porque gostavam dos mesmos. E, enquanto os únicos alimentos doces a que tinham acesso eram frutas, ao satisfazer seu desejo pelo sabor doce, as pessoas automaticamente satisfaziam a sua necessidade de vitamina C e outros tantos nutrientes. Porém, uma vez que o ser humano passou a fabricar a própria comida, especialmente após o desenvolvimento da tecnologia para o refino do açúcar e a manufatura dos alimentos, adquiriu a capacidade de separar a doçura e o conteúdo nutricional. O que as pessoas desejam desvinculou-se do que elas precisam.

O autor segue seu argumento de que o forte desejo evolutivo pelo doce, a forma como a evolução nos compeliu no passado a consumir frutas, foi sequestrado pela industrialização dos alimentos. Nunca comemos frutas por que eram saudáveis. Comíamos por que eram doces, temos desejo de comer doces, e os únicos alimentos doces existentes por 2 milhões de anos eram frutas. Subitamente, temos acesso ao açúcar refinado em quantidades ilimitadas, em “alimentos” sem nenhum valor nutricional. As pessoas então deixariam de comer pois faz mal? Claro que não, afinal, no caso das frutas, não comiam porque fazia bem, e sim porque era doce. A atração pelo doce é, como já dissemos, evolutiva. Uma característica intrinsicamente boa quando aplicada a comida de verdade, mas perniciosa quando aplicada ao mundo moderno.

A indústria alimentícia não se limita a acrescentar quantidades industriais (desculpe o trocadilho) de açúcar a todo o tipo de alimento (veja o rótulo das coisas, de ketchup a pepinos em conserva). Outras características de nosso paladar foram identificadas e introduzidas nos alimentos processados. Há um termo para isso, denominado hiperpalatabilidade, isto é, a característica de um produto de apresentar uma intensidade de sabor muito além daquela presente na comida de verdade. Uma vez que estejamos acostumados a consumir alimentos processados no nosso dia-a-dia, a comida de verdade começa a parecer sem gosto. Isto é muito perceptível nas crianças, que muitas vezes recusam os alimentos reais e só aceitam alimentos processados hiperpalatáveis como biscoitos recheados, salgadinhos, e guloseimas de todo o tipo. Há um excelente documentário (CBS – 60 minutes) sobre os cientistas contratados pela indústria com o objetivo explícito de tornar o sabor artificial dos produtos “irresistível”. Assista Aqui.

A situação é análoga à das drogas. Nosso cérebro possui um “centro do prazer”, que se ativa quando realizamos atividades fisicamente prazerosas, especialmente o sexo. Obviamente, a pressão evolutiva neste caso é imensa, pois está diretamente relacionado à capacidade de produzir descendentes. Drogas de abuso, como a heroína e o crack, ativam direta e intensamente o centro do prazer, desvinculado de qualquer atividade fisiologicamente útil (tal como a reprodução). Assim como no caso da hiperpalatabilidade, em que o desejo por certo sabor foi desvinculado da necessidade de obter nutrição, a hiperestimulação do centro do prazer pelas drogas leva à desvinculação entre prazer e sua utilidade biológica, com resultados desastrosos.

Se você tem dificuldade em largar o pão, a massa e os doces, há portanto bons motivos evolutivos para isso. Mas, como no caso das drogas, não há outro caminho a fim de restaurar a saúde. A boa notícia é que, após um período inicial de abstinência (como nas drogas), você vai cada vez mais redescobrindo o sabor da comida de verdade. Para algumas pessoas, bastam poucas semanas. Para outras, são necessários meses. O fato é que, ao alinhar o seu paladar com os alimentos com os quais evoluímos, manter uma dieta saudável torna-se um prazer, pois finalmente vinculamos novamente nossos desejos e nossas necessidades. Saiba como iniciar um estilo de vida como os nossos ancestrais neste link.

 

Referências:

http://lowcarb-paleo.blogspot.com
http://lowcarb-paleo.blogspot.com/2012/01/sindrome-metabolica-o-flagelo-moderno.html
http://www.cbsnews.com/video/watch/?id=7389748n&tag=contentBody;storyMediaBox

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